O medo, além de ser uma das emoções mais comuns, é necessário para a nossa sobrevivência. Ele pode nos sinalizar perigos reais, fazendo com que tenhamos reações de proteção. Dessa forma, podemos entender que sentir medo não é algo necessariamente ruim e que talvez o mais importante seja justamente a forma como lidamos com ele.
Quando vivenciamos uma situação ruim, tendemos a fazer associações, dessa maneira, quando temos contato com algum elemento que nos lembra a experiência vivida, podemos ter sentimentos de medo, ainda que a situação em si já não seja mais ameaçadora. Uma pessoa que sofreu um assalto dentro de um ônibus pode, por exemplo, passar a sentir medo toda vez que precisar utilizar esse meio de transporte novamente, porque se abriu para ela a possibilidade de que essa situação aconteça. E lembrar das sensações que teve naquele momento é, em certa medida, reviver essas sensações.
Existem muitas variáveis que influenciam os nossos medos, como gênero, classe socioeconômica, idade, nível de desenvolvimento cognitivo, dentre outros. E essas variáveis são importantes para avaliar a necessidade ou não de uma intervenção, já que ajudam a entender o contexto no qual a pessoa se encontra. Um adolescente, por exemplo, está propenso a sentir medo de situações que antes não precisava enfrentar, como as mudanças em seu corpo, em sua rede social e relacional, na forma como interage com outros indivíduos e na mudança de suas emoções, que se tornam mais complexas. Já uma criança que vive em situação de vulnerabilidade socioeconômica, tem mais chances de ter experienciado situações de violências, e por isso ter medos que outras crianças da mesma idade que experimentam uma situação maior de proteção por conta de seu contexto econômico não terão conhecimento. Sendo assim, os medos também podem nos fornecer elementos de compreensão da vida de uma criança ou adolescente. Porém, é preciso cautela ao analisar dessa forma, já que os medos podem ser ainda expressões de fantasias criadas em algumas fases do desenvolvimento.
Quando o medo se torna excessivo, desproporcional ao fator desencadeante ou à realidade, pode haver o desenvolvimento de alguma fobia. As situações passam a ser evitadas ou suportadas com muito incômodo e temor. O contato com o fator desencadeante, pode inclusive trazer sintomas físicos, como sudorese, palpitação e dor de barriga. A necessidade de intervenção nos casos de fobia vai depender do grau de prejuízo na vida de cada pessoa. Diante de todas essas informações, como podemos ajudar crianças e adolescentes a lidarem com seus medos?
Infelizmente muitos pais e cuidadores ainda utilizam o medo como forma de punição, na tentativa de fazer com que a criança ou adolescente obedeça. Essa estratégia pode gerar muitos danos ao indivíduo, e de forma alguma o ajuda no enfrentamento e superação de seus medos. É importante não subestimar o sofrimento de crianças e adolescentes e a repercussão negativa que os medos podem ter. Por isso, acolher a criança quando ela fala ou demonstra medo é o primeiro passo. Escutando de forma atenta, para que ela saiba que está sendo compreendida em seu sofrimento.
Muitas vezes o medo está relacionado ao desconhecido, como por exemplo aos desafios que a fase da adolescência traz, como falamos anteriormente, ou com quando uma criança percebe que há um fator estressante em seu ambiente familiar, mas os adultos tentam preservá-la não expondo o que está acontecendo de maneira honesta. Sendo assim, uma maneira de ajudar a lidar com o medo, é conversando de maneira sincera e esclarecendo eventuais dúvidas que possam aparecer, dessa forma, a criança ou adolescente terão um maior entendimento do momento que estão vivendo, o que pode ajudar na busca pelos elementos emocionais e cognitivos de enfrentamento do medo.
Essa postura estimula ainda a autonomia, importante para que a criança entenda que pode lidar com seus medos e tenha uma relação de apoio e confiança com os adultos que a cercam, mas compreendendo que aos poucos pode ir assumindo a responsabilidade de si. Isso não significa ver a criança ou o adolescente como totalmente independentes dos seus cuidadores e responsáveis, mas sim vê-los como capazes de lidarem com as dificuldades que são próprias da existência.
Por fim, é preciso estar atento para perceber quando um medo vai se tornar insuportável, acarretando prejuízos à rotina diária. Em situações de muito sofrimento, ou em que há uma grande dificuldade em lidar com os medos, é importante buscar ajuda profissional. As fobias podem ser acompanhadas principalmente por psicólogos, mas também pode haver a necessidade de uma intervenção psiquiátrica. Mas além dessas duas intervenções, é imprescindível entender o contexto em que a criança vive e o que mudanças são possíveis em suas relações. O medo é próprio da existência, e podemos sempre encontrar novas maneiras de lidar com ele!
Texto produzido pela psicóloga: Caroline Ribeiro
Material de referência:
- Tenho medo de quê? – Teresa Helena Schoen , Maria Sylvia S. Vitalle – disponível em https://www.scielo.br/
- A Clínica psicológica infantil em uma perspectiva existencial – Ana Maria Lopez Calvo de Feijoo
- Video: Fobia ou Medo ? Psiquiatra Maria Fernanda – Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sNpCfTPVwtM&t=197s